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Mensagem da Semana

E, eis que cedo venho, e o meu galardão está comigo, para dar a cada um segundo a sua obra. Apocalipse 22:12

segunda-feira, 9 de julho de 2012

1932: a guerra de 80 anos que ainda não acabou

Eis algumas perguntas intrigantes para um forasteiro, como eu e milhões de brasileiros, que constrói sua vida em São Paulo:

1) Por que não há, na capital paulista, ao contrário das outras capitais metrópoles, uma única rua ou avenida que homenageie Getúlio Vargas?

2) Por que depois de Júlio Prestes, eleito presidente em 1930, mas não empossado, nenhum outro paulista conseguiu tal feito? (Jânio Quadros nasceu no Mato Grosso e Fernando Henrique Cardoso no Rio de Janeiro)

3) Por que na bandeira paulista há a inscrição “Non Ducor, Duco” (Não sou conduzido, conduzo)?

4) Por que a data mais importante de São Paulo, o Nove de Julho, celebra um movimento que poderia ter separado o estado do restante do País?

5) Afinal, a revolução constitucionalista de 1932 foi um movimento em defesa da democracia ou uma tentativa frustrada de golpe, arquitetada pelas oligarquias cafeeiras de São Paulo, que se sentiam ameaçadas pela Revolução de 1930?

Essas perguntas podem parecer distantes, mas, até hoje, ecoam na política brasileira.



Sim, estão mais presentes do que se imagina. Dias atrás, ao iniciar sua corrida pela prefeitura de São Paulo, José Serra não falou absolutamente nada sobre a cidade que pretende comandar. Tratou sua eventual vitória como uma batalha democrática a ser vencida. “O que acontecer em São Paulo é fundamental para o que vai acontecer no Brasil”, disse Serra. “O que está em jogo aqui é o futuro de um sistema democrático, republicano, que respeita as oposições, que respeita a democracia, que respeita a liberdade de imprensa. A nossa vitória aqui significa afirmar a luta democrática do povo brasileiro”.

O Brasil vive hoje sua plenitude democrática, nunca tantos se expressaram como agora, mas o discurso das oposições, frequentemente, trafega pela defesa de uma liberdade, que não está ameaçada. De todo modo, Serra se coloca como um dos heróis de 1932, que estão homenageados no Obelisco do Ibirapuera, porque se levantaram e pegaram em armas para enfrentar Getúlio Vargas.

São Paulo não gosta de Getúlio. E, de certa forma, também rejeita o chamado “lulismo”. Por quê? Certa vez, fiz essa pergunta ao economista Delfim Netto. E ele, com a fina ironia de sempre, respondeu: “Os paulistas nunca perdoaram o bem que Getúlio fez por São Paulo”.



Em 1959, Delfim Netto publicou um trabalho chamado “O problema do café no Brasil”, considerado um clássico da historiografia econômica. Delfim demonstrou que a economia cafeeira era intrinsicamente geradora de instabilidades cambiais. E quem começou a libertar o Brasil desses ciclos foi justamente Getúlio Vargas, ao impulsionar o processo de industrialização do País.

Se os paulistas rejeitam Getúlio e o “lulismo”, o ex-presidente também tem um caso mal resolvido com São Paulo. Depois de cumprir seus dois mandatos na presidência da República, Lula quer porque quer tomar a principal cidadela tucana no País. E sempre fez de Getúlio seu principal referencial – mesmo em imagens oficiais, como aquela em que sujou as mãos de petróleo. Se Fernando Henrique tomou posse prometendo enterrar a era Vargas, Lula tratou de resgatá-la.



Ao abordar o Nove de Julho de 1932, Lula tratou a data que os paulistas chamam de revolução como golpe. “Lamentavelmente, uma parte da elite brasileira, inclusive uma parte da elite intelectual, inconformada porque não conseguiu ganhar o golpe de 32... que chama de revolução, mas aquilo foi uma tentativa de golpe [...] não se conforma... [então] é muito triste, aqui em São Paulo a gente não encontra uma rua com o nome de Getúlio Vargas", disse o ex-presidente, em 2010, ao inaugurar um auditório do Sindicato dos Metalúrgicos em homenagem a Getúlio.



José Serra, naturalmente, pensa de forma oposta. Como governador de São Paulo, publicou, pela Imprensa Oficial, um livro do historiador Marco Antônio Villa – um dos maiores críticos do ex-presidente Lula – que resgata o movimento de 1932 e até mesmo um livreto em quadrinhos para distribuição nas escolas. Anos atrás, também publicou um artigo na Folha de S. Paulo sobre o Nove de Julho, onde se lê:

“A participação da juventude dava ao movimento um ar de esperança na construção de um país democrático. Mais uma vez, estava sendo jogada a sorte do Brasil. Após a independência e a República, o desafio era o compromisso intransigente e inegociável com a democracia.

Enganam-se os que imaginam que recordar 1932 é simplesmente remexer no velho baú da história. É muito mais que isso: é uma bela data da história do Brasil e de São Paulo. Seus sinônimos são a liberdade, o voto secreto, a eleição livre, a independência dos três Poderes, a Constituição.”

José Serra talvez não sonhe mais com a presidência. Talvez seja um Júlio Prestes redivivo, que não chegou lá por ter sido traído pelos mineiros (leia-se Aécio Neves). Afinal, muitos historiadores avaliam que a política do café com leite foi rompida porque os mineiros se aliaram aos gaúchos na Revolução de 1930. E, dois anos depois, teriam deixado os paulistas sozinhos no combate contra as forças getulistas.

Lula, que se vê como herdeiro de Getúlio, talvez volte em 2018, ou mesmo em 2014, caso Dilma decida não concorrer à reeleição. Se isso ocorrer, mesmo que em eleições livres, podem escrever: as forças de São Paulo, lideradas por nomes como Reinaldo Azevedo e Augusto Nunes, pegarão em armas para defender a ordem constitucional. Golpe ou revolução?



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