“Confiança”
é palavra fundamental no léxico da democracia representativa. Enquanto sistemas
autoritários de governo se sustentam numa relação de força, modelos
democráticos se legitimam com a delegação do poder a mandatários escolhidos
pela população.
Existem
diferentes teorias para explicar por que, exatamente, esse processo dá certo,
mas há consenso em torno de um aspecto: ele só funciona sem sobressaltos quando
os cidadãos acreditam que seus votos são colhidos e computados de forma
correta, livre de manipulações. Do contrário, a própria representação é posta
em xeque.
A reflexão
torna-se oportuna por causa de uma notícia preocupante. A gestão das urnas
eletrônicas nos 217 municípios do Maranhão foi confiada, nas eleições deste
ano, a uma empresa cujo dono tem vínculos com a família Sarney.
Não se trata
de prejulgar Luiz Carlos Cantanhede Fernandes e sua empresa, a Atlântica
Serviços Gerais, a quem o Tribunal Regional Eleitoral maranhense, após realizar
licitação, incumbiu a responsabilidade de fornecer os 616 funcionários
encarregados de transportar e armazenar as urnas, carregá-las com o software e
transmitir os dados da votação.
Não surgiu,
por ora, nenhum indício material de que uma fraude esteja em curso. Fernandes,
porém, não apenas é sócio do marido da governadora Roseana Sarney (PMDB) como
também apareceu, em 2002, num episódio nebuloso envolvendo a apreensão de uma
grande soma de dinheiro em espécie numa empresa de Roseana.
Tais fatos
deveriam ter bastado para deixá-lo de fora da licitação. E, como se não fossem
suficientes, suspeita-se de que Fernandes tenha ligações pessoais com Lobão
Filho (PMDB), candidato a governador com a bênção dos Sarney.
A situação
só é possível porque o Tribunal Superior Eleitoral decidiu descentralizar a
gestão das urnas. Até 2010, o serviço era prestado por uma única empresa em
todo o país. Agora, cada um dos TREs deve contratar seu fornecedor.
Em alguns
Estados, nos quais a política e a economia são dominadas por grupos poderosos,
encontrar empresas sem ligações suspeitas é tarefa inglória. Daí não decorre,
por óbvio, que as precauções devam ser relaxadas. Quando existe desconfiança
quanto à lisura do processo eleitoral, a própria democracia termina maculada.
Do blog Marrapá
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