Governador Flávio Dino diz que não
foi possível corrigir em 30 dias os erros cometidos pelo clã Sarney
durante 50 anos, mas garante ter acabado com o nepotismo no Estado e
promete que ninguém no novo governo assaltará o erário público
por Josie Jerônimo
DE VOLTA PARA O FUTURO
Comunista repete Pedro Malan, ex-ministro da Fazenda de FHC:
"No Brasil até o passado é imprevisível"
Não bastasse o rombo nas contas públicas
deixado pela antecessora, o governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB),
deparou-se com mais um grave e surpreendente problema administrativo,
ao encerrar seu primeiro mês de mandato: a ex-governadora Roseana Sarney
não quitava as despesas com energia dos órgãos públicos havia meses e o
Estado deve R$ 30 milhões à companhia elétrica. A pendência se soma à
dívida de R$ 1,1 bilhão herdada do governo anterior que, aos poucos,
será equacionada, segundo afirmou Dino em entrevista à ISTOÉ. “É
impossível que a gente corrija em 30 dias tudo de errado que fizeram em
50 anos. De qualquer forma, acabamos com o nepotismo e não há ninguém no
governo ocupado em assaltar o erário público”, salientou o novo
governador.
"O que for estritamente pessoal na Fundação Sarney não
interessa para a manutenção com dinheiro público.
Ele pode fazer um memorial privado"
interessa para a manutenção com dinheiro público.
Ele pode fazer um memorial privado"
Sobre o cancelamento da obra da Refinaria
Premium I, muito criticada pela oposição, Dino atribuiu a culpa ao
ex-ministro de Minas e Energia Edison Lobão e ao seu padrinho José
Sarney e lembrou da relação deste com Paulo Roberto Costa, ex-diretor da
Petrobras, partícipe e delator do esquema de desvios na estatal. “Sabe
Deus o que está enterrado nesse buraco da refinaria, boa coisa não é. O
intermediário dos negócios com o governo do Maranhão era o notório e
notável Paulo Roberto Costa. Era ele que vinha aqui. Em todas as fotos
da refinaria, com Roseana, com Sarney, com Lobão, está o Paulo Roberto
Costa.”
"O intermediário dos negócios com o governo do Maranhão
era o notório e notável Paulo Roberto Costa. Era ele que vinha aqui"
era o notório e notável Paulo Roberto Costa. Era ele que vinha aqui"
Istoé -
Um mês de governo foi tempo suficiente para o sr. conhecer a real situação do Estado?
Flávio Dino -
Há uma frase atribuída ao
ex-ministro Pedro Malan que se aplica à realidade em que a gente se
encontra: no Brasil até o passado é imprevisível. Toda semana é uma
surpresa. Na terça-feira nós descobrimos que a conta de energia elétrica
dos órgãos públicos não estava sendo paga havia vários meses, uma
dívida de R$ 30 milhões. Não houve uma transição organizada: no meio do
processo a governadora Roseana Sarney renunciou. Então, o que nós
apuramos até aqui são débitos da ordem de R$ 1,1 bilhão. Nós fizemos uma
economia rigorosa de custeio, seguramos a abertura do Orçamento e
estamos lutando para atualizar esses débitos passados, sobretudo com os
servidores e prestadores de serviço. As dívidas inadiáveis, como o
empréstimo que Roseana havia feito com o Bank of America, uma parcela de
R$ 110 milhões, nós pagamos neste mês.
Istoé -
Antes de assumir, o sr.
impediu sua antecessora de fechar um contrato bilionário de
terceirizados para os presídios. Qual foi a alternativa para lidar com a
falta de funcionários?
Flávio Dino -
Vamos substituir os
terceirizados por trabalhadores temporários. Mesmo pagando um salário
maior, o Estado terá uma economia anual de R$ 20 milhões. Isso mostra
que a terceirização é ineficiente. O passo seguinte é fazer o concurso
ainda neste ano para preenchimento dos cargos de agente penitenciário.
Esse é o primeiro desafio; o segundo é ampliar e melhorar os presídios.
Encontramos as obras de unidades prisionais paralisadas, porque elas
haviam sido contratadas com base em situações de emergência que foram
decretadas no auge da crise. O presídio Timon era para ter sido
concluído em outubro; o de Imperatriz, em setembro. As obras não foram
concluídas. Um caminho jurídico para dar sequência às obras é a
assinatura de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC).
Istoé -
Por que os órgãos de
controle do Estado não detectaram as irregularidades nas contas públicas
durante o mandato de Roseana Sarney?
Flávio Dino -
Os mecanismos de controle
interno, externo e as ações do Ministério Público sempre foram muito
frágeis, de baixa eficácia. Estamos tentando redesenhar esses
mecanismos. O governo procurou o Tribunal de Contas do Estado para fazer
o treinamento dos novos servidores. Estamos apurando e encontrando
absurdos. Vamos provocar o tribunal de contas, o Ministério Público.
Vamos enviar tudo para que eles tomem as providências que considerarem
necessárias. Há casos de total afronta à lei de responsabilidade fiscal.
Istoé -
O sr. recebeu críticas pela composição do secretariado. Existem parentes e apadrinhados em seu governo?
Flávio Dino -
Não há nenhum parente meu
em nenhum cargo até o 20º grau, rigorosamente nenhum. Em relação aos
secretários, o que aconteceu é que nós estamos formando equipes. As
pessoas citadas como aliados são servidores de carreira de vários
órgãos. O caso em que mais bateram foi o da chefe de gabinete do
governador. Ela é dirigente do PCdoB há 20 anos, foi dirigente do
sindicato e coordenou minhas campanhas desde 2006. É professora
concursada. Ela atualmente tem relação afetiva com outro secretário. É a
mesma situação da ministra Gleisi Hoffmann com o ministro Paulo
Bernardo. Eu não posso punir o amor, não posso controlar a vida afetiva
das pessoas. Ele a nomeou? Não, fui eu quem nomeou. Não há nenhuma
violação legal. Há uma tentativa dos nossos antecessores de buscar nos
igualar a eles. Eles dizem o tempo todo: nada mudou. Mas o povo está
vendo, não há nepotismo no Maranhão, não há ninguém no governo ocupado
em assaltar o erário público, essa é uma grande mudança. Acabamos com as
quadrilhas que operavam no governo do Maranhão. Nós pegamos o portal da
transparência com 40% de gastos secretos e estamos refazendo o sistema.
Eles estão nos acusando de deixar o portal fora do ar durante a troca
da metodologia. Mas nós estamos corrigindo uma fraude. Eles cobram, mas é
impossível que a gente corrija em 30 dias tudo de errado que fizeram em
50 anos.
Istoé -
O cancelamento das obras da Refinaria Premium I trará prejuízos ao Maranhão?
Flávio Dino -
A refinaria é uma boa
ideia mal executada. Que o Brasil precisa de mais refinarias não há
dúvida. Que é justo e necessário que essas refinarias sejam construídas
nas regiões Norte e Nordeste é indiscutível. O principal produto do
complexo portuário é combustível. O Maranhão é um grande distribuidor de
combustível para o Norte e o Nordeste, é um entreposto. Temos
necessidade de refino, porto, ferrovias e rodovias. A própria
localização geográfica do Maranhão é estratégica, pois está no meio do
caminho, tem acesso direto ao Centro-Oeste via ferrovias. São muitas
vantagens técnicas.
Istoé -
Então, por que o projeto fracassou?
Flávio Dino -
O problema foi a
apropriação eleitoreira, a agonia do Edison Lobão e do José Sarney
quando eram ministro de Minas e Energia e presidente do Senado. Forçaram
a mão para que o projeto da refinaria saísse de qualquer jeito, sem
projeto, sem estudo técnico. Deu no que deu. Agora eles estão querendo
empurrar o problema para mim. Eu tenho que salvar a refinaria do
Maranhão. Eles me cobram todo dia. O Sarney fez um artigo dizendo que o
governo tem que se mobilizar. Claro que eu desejo que o Maranhão receba
uma refinaria, mas quem criou o problema foram eles. Que resolvam. O
certo é que enterraram R$ 1,5 bilhão aqui e ninguém sabe como e por que
agora há um vazio completo. Estou esperando passar a situação de
instabilidade institucional muito aguda da Petrobras, que acabou
resultando nesse anúncio da saída da Graça Foster. Estou esperando as
coisas se arrumarem para eu restabelecer um diálogo com a Petrobras, em
outras bases, em outros termos, dessa vez como uma coisa séria. Não por
acaso, o intermediário dos negócios com o governo do Maranhão era o
notório e notável Paulo Roberto Costa. Era ele que vinha aqui. Em todas
as fotos da refinaria, com Roseana, com Sarney, com Lobão, está o Paulo
Roberto Costa. Era ele o interlocutor, ele que vinha, ele que reunia,
ele que anunciava. Sabe Deus o que está enterrado nesse buraco da
refinaria. Boa coisa não é.
Istoé -
O ex-presidente José
Sarney atribuiu os cortes de verbas na fundação que guarda seu acervo a
uma vingança. A instituição será fechada?
Flávio Dino -
O que a gente fez
emergencialmente foi reduzir os gastos. Havia um comprometimento com
pessoal lá que ultrapassava R$ 2 milhões. Reduzimos a folha. Agora
estamos averiguando a parte estrutural do prédio. O Convento das Mercês
está com risco de desabamento, várias partes estão escoradas. Não
consigo entender como deixaram um prédio do século XVII naquela
situação. Estamos rediscutindo o modelo da fundação. O que se referir ao
mandato presidencial do senador José Sarney pode integrar o acervo da
fundação. O que for estritamente pessoal não interessa para a manutenção
com dinheiro público. Ele pode fazer um memorial privado, custeado com
dinheiro privado.
Istoé -
Qual é o futuro da Fundação Sarney?
Flávio Dino -
Nossa proposta é que
fiquemos responsáveis apenas pela guarda do que é estritamente
relacionado ao período presidencial. O passo seguinte é transformá-la em
uma fundação de memória republicana, e não no registro de passagem de
um único político.
Istoé -
No Congresso, o sr.
ajudava nas articulações do governo. Como analisa a eleição de Eduardo
Cunha (PMDB-RJ) para a presidência da Câmara?
Flávio Dino -
Menos problemas do que se
prevê. O governo continua a ter uma maioria folgada. A grande questão é a
gestão dessa maioria. Há alguns anos, o PT tinha uma visão de que a
chave da governabilidade é um duopólio PT/PMDB. Essa foi a estratégia do
segundo mandato do Lula e do primeiro mandato da Dilma. Os conflitos e
dificuldades iniciais mostram que é hora de uma visão mais aberta.
Istoé -
Com os desdobramentos do
escândalo da Petrobras, crises hídrica e energética e um inimigo no
comando da Câmara, o governo corre o risco de atravessar uma crise
institucional?
Flávio Dino -
Crise institucional, não.
Passamos por muita coisa na superação da ditadura para a democracia.
Está muito claro que não há um cenário de impasse sem saída. A tendência
é haver algum tipo de rearranjo, pacto entre as forças políticas. A
iniciativa de abrir um diálogo com a oposição tem que partir do governo.
A continuidade do clima do segundo turno não ajuda para que os
problemas da população sejam resolvidos. Essa polarização sectarizada
entre PT e PSDB não ajuda o Brasil. Essa é uma briga paulista que acabou
se tornando uma questão nacional de um modo, a meu ver, muito
artificial.
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